Particularmente falando, amo criar um milhão e meio de personagens nas minhas histórias, mas acredito que isso depende muito de qual tipo de trama é apresentada. Eu escrevo distopias com o significado que literalmente diz que todos são objetos descartáveis usados apenas para a diversão dos outros e, por isso, o estilo de escrita recheado de personagens combina com o que quero mostrar para meu público, mas não consigo gostar de romances com muitos personagens, por exemplo.
Cada história quer dizer alguma coisa. Em algumas, devemos nos apegar aos personagens e, em outras, precisamos desejar que morram. Mesmo assim, isso não significa que uma história com vários personagens não seja boa porque, para que a gente queira que tal personagem morra de uma forma dolorosa, outro personagem precisa nos convencer disso enquanto outro tenta provar o contrário.
Em “O Senhor dos Anéis”, temos vários protagonistas, mas suas participações são separadas e cada um tem sua devida tarefa e significado. Nenhum personagem foi criado simplesmente porque o Tolkien quis. Existe profundidade e divisão. Quando Frodo e Sam vão para Mordor, por exemplo, se separam do resto do grupo, garantindo que a história não fique entediante já que agora passou a ter mais de um foco.
Além de o Tolkien ter feito com que muitos personagens fizessem sentido no mundo fantasioso que ele criou, também faz sentido como metáfora. A ideia de reinos diferentes traz o significado da inclusão, mostrando que até mesmo um hobbit pode se tornar um guerreiro e um elfo com certeza tem a chance de virar o melhor amigo de um anão, mesmo sendo de reinos rivais.
Para criar essa narrativa, o Tolkien foi obrigado a criar diversas criaturas justamente para que sua história fosse possível. Ele criou personagem por personagem, cidade por cidade. Tem literalmente um mapa completamente novo. Por isso, o excesso de personagens faz muito sentido.
Em uma história que se passa em um mundo real e tem o foco em um casal, por exemplo, isso não faria tanto sentido. Tudo bem ter vários personagens secundários, mas fica muito confuso quando o escritor tenta dar muita atenção para personagens que não importam tanto na narrativa.
“Cem anos de solidão” é um livro que acompanha várias gerações de uma mesma família. Ele tem cerca de 400 páginas e, nelas, um total de 100 anos. Gostei bastante do começo e ficou ainda melhor no meio, com a história do coronel Aureliano, mas no final não sabia quem era quem!
Isso não é um grande problema, o que me tirou da história foi o quão inúteis os personagens são. A história gira ao redor deles, mas ninguém parece importar de verdade para a narrativa. Acompanhamos geração por geração, mas chegamos em um ponto em que não queremos mais saber sobre o que o milésimo Buendía está fazendo!
Nos livros da Agatha Christie, isso é bem diferente porque, nesse caso, todos os personagens são muito importantes. Nos seus livros, há uma grande quantidade de personagens e todos são suspeitos de ter cometido algum assassinato. Por serem suspeitos, o leitor naturalmente vai prestar mais atenção em cada movimento para tentar descobrir quem é o tal do assassino.
Quando temos muitos personagens, precisamos chamar a atenção do público de certa forma porque, senão, ficarão vazios. No meu segundo livro, “Luzes, câmera e vingança”, temos uma árvore geneológica consideravelmente confusa (menos do que a dos Buendía, eu garanto) formada pela família Capellier, mas os personagens têm ligações familiares diferentes.
Vamos usar os quatro irmãos, por exemplo. Léopold não dá atenção para suas irmãs por ter construído sua própria vida, enquanto Jeanne lembrou de todos os seus parentes quando foi trabalhar no exterior e trouxe presentes. Além disso, Isabelle é muito mais criativa do que Josefa, que com certeza é mais fria do que Jeanne.
São vários personagens, mas é fácil identificar cada um por terem características muito diferentes. Mesmo tendo o mesmo sobrenome e a mesma linhagem, isso não significa que sejam cópias uns dos outros.
O exemplo perfeito disso é aquela criatura amarela que ama bananas: os Minions! Todos são idênticos e usam as mesmas roupas, mas um é mais agitado ou mais atrapalhado do que o outro. Até mesmo a aparência é perceptivelmente diferente, caso você preste atenção. Bob é um Minion achatado comparado aos outros, enquanto o Kevin é espichado.
Quando criamos uma história confusa, precisamos tomar cuidado porque precisamos incluir o público no mistério e não fazer com que ele se sinta burro. Informações em excesso serão esquecidas e ignoradas. Lembre que ninguém conhece a história tanto quanto você e, por isso, é seu trabalho mostrar esse universo como se estivesse ensinando um bebê a falar.
Outra regra é não menosprezar o público e não dar tudo de mão beijada. Ao mesmo tempo, ele deve ser incluído. A história não é mostrada, algo que é simplesmente visto e acaba por aí. O público quer descobrir tudo sobre os personagens, seus passados, seus objetivos – tudo!
Uma dica divertida é escrever como se estivesse contando uma fofoca. Conte como se estivesse conversando com seu melhor amigo, não como se estivesse escrevendo uma redação para o vestibular. Inclua o público e faça com que ele vire um dos personagens.
Outra coisa importante é não colocar nomes muito parecidos como “Anabelle” e “Anaís”. Parecem bem diferentes, mas, quando lemos, acabamos nos confundindo! Eu mesmo me confundi algumas vezes com a Pilar Ternera e a Petra Cotes...
Personagens devem adicionar algo para a história, não apenas estar ali. Até mesmo o carroceiro pode acabar tendo certa importância, mesmo que seja com uma piada simples. Essa é a diversão da história! Exagerar e criar, mas cuide para dar atenção para todos os personagens de forma igualitária porque, senão, eles podem sumir dos olhos do público. Não é isso que nós queremos que aconteça.
Os nomes dos meus livros são “Quer jogar? Tesouras não cortam só cabelo” e “Luzes, câmera e vingança”. Ambos estão disponíveis no Kindle e, na versão física, em sites como Mercado Livre, Ponto Frio, Americanas, Casas Bahia etc.! Confira as sinopses:
"Nesta distopia, diversas pessoas pagam um alto preço para assistir e ter a chance de entrar no honrado O Jogo, no qual há um grupo de pessoas e, ali, um assassino. Na Temporada 11, no entanto, algumas coisas dão errado, mudando o destino desse evento para sempre. Entre assassinatos brutais e disputas entre jogadores, a plateia faz apostas e observa-os com fogo nos olhos, mal podemos esperar para descobrir o que acontecerá a seguir." Dilva Camargo Artista Visual.
“Durante o jantar, ocorre uma morte repentina na mesa da família Capellier. No entanto, não podem chamar a polícia porque seu sobrenome não seria muito bem-visto na delegacia por causa do passado de Francisco, um corrupto de primeira classe.
Para a surpresa de todos, ele morre, mas ninguém iria no seu funeral porque era odiado pelo mundo inteiro. Para não deixar passar em branco, os Capellier, uma família burguesa, não podiam perder a oportunidade de convidar seus inimigos (pelo menos, os que podiam listar) para se hospedarem na sua mansão absurdamente glamorosa e compartilhar a raiva mútua que sentiam contra o homem que, agora, estava morto.
Todos aceitam o convite sem pensar duas vezes, mas a família não imagina o quão sedentos por vingança estão os convidados...”
Valéria do Sul
(Deivid Jorge Benetti),
do Portal de Notícias MPV